O princípio da proteção ao obreiro, edição nº 584

Por: Janguiê Diniz
20 de Nov de 1995

1 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS


Direito Material do Trabalho:


O consubstanciado por um ramo individual e um ramo coletivo, cada um possuindo regras, processos e princípios próprios. do Trabalho são: 1) princípio de proteção que se pode concretizar nas ideias in dubio, pro operário, regra da aplicação da norma mais favorável, e regra da condição mais benéfica; princípio da irrenunciabilidade dos direitos; da continuidade da relação de emprego; da primazia da realidade; da razoabilidade...


Trabalho constrói-se a partir da constatação fática da diferenciação social, econômica e política básica entre os sujeitos da relação jurídica central desse ramo jurídico específico." A disparidade existente entre os atores principais fez surgir um Direito Individual do Trabalho altamente protetor, caracterizado por métodos, princípios e normas que buscam reequilibrar, juridicamente, a relação desigual vivenciada na prática cotidiana da relação de emprego.


No pertinente ao Direito Coletivo, sói ocorrer o contrário, porquanto é um ramo jurídico "construído a partir de uma relação entre seres teoricamente equivalentes: seres coletivos, o empregador de um lado, e de outro, o ser coletivo obreiro, mediante as organizações sindicais. Em correspondência a este quadro fático distinto, surgem, obviamente no Direito Coletivo, categorias teóricas, processos e princípios também distintos". Americo Pia Rodrigues, assevera, com a propriedade que lhe é pertinente, que os Princípios do Direito do Trabalho constituem o fundamento do ordenamento jurídico do trabalho; assim sendo, não pode haver contradição entre eles e os preceitos legais.


Estes estão acima do direito positivo, enquanto servem de inspiração, mas não podem tornar-se independentes dele". Noutro falar, os princípios, embora informem ou inspirem o direito positivo, de certo modo estão condicionados por este. Carnelutti, sendo mencionado por Pia Rodrigues, assevera: 2 "Os princípios gerais do direito não são algo que exista fora, senão dentro do próprio direito escrito, já que derivam das normas estabelecidas. Encontram-se dentro do direito escrito como o álcool no vinho: o espírito ou a essência da lei".


Na nossa concepção, estes não se situam dentro do direito positivado, portanto na fase política ou pré-jurídica, estes orientam o legislador a criarem o direito positivado. Vários princípios especiais do Direito do Trabalho.


Na ótica de Pia Rodrigues, os princípios especiais do Direito Acrescenta este autor 4 que todos esses princípios são utilizados também no Direito Coletivo. Cita como exemplo o princípio protetor que rege ambos os ramos do Direito laboral, embora de formas diferentes. Estudaremos os princípios conforme a classificação esposada pelo mestre de renomada Plá Rodrigues, porquanto a melhor classificação até hoje já posta em livros de doutrinas sobre os princípios norteadores do Direito laboral.


2. DENOMINAÇÃO, FUNDAMENTO E CONSAGRAÇÃO NO DIREITO POSITIVO


O princípio de proteção a senão o mais importante o mais fundamental que orienta o Direito do Trabalho pois este, "ao invés de inspirar-se num propósito de igualdade, responde ao objetivo de estabelecer um amparo preferencial a uma das partes: o trabalhador". Diferentemente do Direito comum, que tern a preocupação maior de assegurar a igualdade jurídica entre os contratantes, no "Direito do Trabalho a preocupação central parece ser a de proteger uma das partes corn o objetivo de, mediante essa proteção, alcançar-se uma igualdade substancial e verdadeira entre as partes".


Certos estudiosos do assunto o denominam de princípio pro-operario ou princípio mais favorável ao trabalhador. Outros, como Menéndez Pidal 5, utilizam a terminologia de "princípio tutelar". Mozart Victor Russomano Ano, de "princípio de proteção tutelar". Outros autores, de "princípio protetor, ou princípio de favor ao trabalhador". Nós, nas pegadas de Plá Rodriguez 7, preferimos chamar de Princípio de Proteção. "O fundamento deste princípio está ligado à própria razão de ser do Direito do Trabalho." Cesarino Júnior escreveu em uma de suas obras 8 que, "sendo o direito social, em Última análise, o sistema legal de proteção dos economicamente fracos (hipossuficientes), a claro que, em caso de dúvida, a interpretação deve ser sempre a favor do economicamente fraco, que é o empregado, se em litígio corn o empregador".


 Existem alguns pensamentos contrários a esse princípio J. Pinto Antunes 9, citado por Plá Rodrigues, enfatiza que é assegurado a todos os indivíduos empreenderam pela própria Lei Maior; nessa faculdade "funda-se a riqueza e a prosperidade nacional", logo, inconstitucional seria esse princípio, pois contrariou as bases fundamentais do regime económico e político. Em caso de vida, deve-se decidir pela empresa, conservando-a em face de seu papel político e constitucional. Plá Rodrigues 10, juntamente com outros juslaboralista si 1, acha desnecessário a consagração no Direito positivo, em face da própria natureza do princípio, pois, segundo eles, esse princípio se situa acima do Direito positivo.


Acrescenta que "ele resulta da orientação de todo o conjunto de normas, do propósito que as inspira, da ideia central que opera como Rodrigues I o salienta que nas lides trabalhistas tende a se tornar patente a posição de que o princípio deve predominar inclusive no campo do direito formal. Permissa maxima venia, não concordamos com os preclaros de renomada, porquanto, em seara de processo existe um principio de Direito Processual Civil, que utilizamos subsidiariamente no Direito Processual Trabalhista, o da igualdade das partes no processo, consagrado no art. 125, inciso I, do CPC, quando argui: "O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, competindo-Lhe: I) assegurar às partes igualdade detratamento". A aplicação dessa regra demanda moderação, aconselhando, ademais, que no caso de dúvida sobre a interpretação mais favorável ao trabalhador, deve-se adotar a posição do próprio trabalhador.


No dia 5, note-se que existem, entretanto, positives comum, aqui é desprezado com o afã de compensar a desigualdade econômica, criando-se em proveito dos trabalhadores só de ser essencial". Entretanto, se recepcionado pelo ordenamento positivo, isto pode ocorrer de duas maneiras: no ordenamento instrumental ou material. A recepção no ordenamento material consiste em incorporar a norma constitucional ou a uma norma programática de especial significado... algum princípio genérico de proteção ao trabalho, ou que ponha o trabalho sob a proteção do Estado". A recepção no ordenamento instrumental se dá na incorporação de regras de interpretação que incluam, seja o princípio geral, seja algumas das formas de sua aplicação. Por exemplo, quando se estabelece, em um Código do Trabalho ou lei orgânica da Justiça do Trabalho, normas referentes a como se deve interpretar as leis do trabalho".


3. FORMAS DE APLICAÇÃO


Plá Rodrigues 12 entende que o princípio ora em estudo se aplica sob as formas das regras: a) a regra in dubio, pro operario; b) a regra da norma mais favorável; c) a regra da condição mais benéfica, que estudaremos per summa capita.


3.1. Regra in dubio, pro operário


Essa regra é no sentido de que, em havendo uma norma, deve o juiz ou o intérprete escolher, entre os vários sentidos possíveis da regra, aquele que seja mais favorável ao trabalhador. É sabido que no Direito Privado o mais fraco é sempre o devedor. Por esse fato a amplamente aceita a parêmia favor pro reo.


Entrementes, nas relações trabalhistas o que se dá o contrário, já que o trabalhador, que no caso é o credor, sempre o mais fraco perante o empregador. Logo, recusa-se a parêmia do Direito Privado e aplica-se o brocardo in dubio, pro operario ou in dubio, pro misero, função similar ao que cumpre o preceito in dubio, pro reo no Direito Penal. E para dizer mais, a conditio sine qua non para aplicação do princípio: a) só pode ser utilizado quando existir dúvida acerca do alcance da norma legal; e b) só pode ser utilizado quando não estiver em desacordo corn a vontade do legislador, pois o princípio a suscetivel de aplicaç n5o s6 e apenas quando "uma norma a suscetivel de ser interpretada de diversas maneiras, isto 6, quando há uma verdadeira dúvida".


O objetivo da aplicação dessa regra do princípio protetor e para determinar o verdadeiro sentido da norma, entre os vários possíveis, "de sorte que, quando uma norma nao existe, não é possível recorrer a este procedimento para substituir o legislador e muito menos a possível usar esta regra para afastar-se do significado claro da norma.


Ou para atribuir-lhe um sentido que de modo nenhum se pode deduzir de seu texto ou de seu contexto". De acrescentar, ademais, que a regra se aplica apenas na exegese da norma jurídica, jamais na apreciação da prova "porque os fatos devem chegar ao juiz tal como ocorreram" 13. Uma coisa é interpretar a norma para determinar o seu alcance, outra é apreciar as provas. Esse princípio não permite suprir deficiências probatórias. Logo, a manifestação dessa regra é apenas em Direito material, jamais em Direito instrumental. no sentido de que a regra in dubio, pro operario se aplica também ao direito formal.


Veja José Isidoro Somare 14. No Brasil, não há nenhuma norma expressa que consagre essa regra; entretanto, ela é aceita de maneira ampla pela communis opinio doctorum et consensus omnium jurisprudential.


3.2. Regra da norma mais favorável


Consiste essa regra em aludir que, existindo várias normas aplicáveis a uma mesma situação jurídica, deve-se aplicar aquela que mais beneficia o empregado, mesmo que as normas sejam de hierarquia diferente, pois, como enfatizou Cessária, a aplicação desse princípio no Direito do Trabalho provoca uma espécie de quebra Iii Gica do sistema da hierarquia das fontes formais do direito 16.


Na visão de Amauri Mascaro Nascimento 17, "o vértice da pirâmide da hierarquia das normas trabalhistas será ocupado pela norma mais favorável ao trabalhador dentre as diferentes em vigor", diferentemente dos outros sistemas positivos que tern como vértice a própria Lex Fundamentalis. Entretanto, nao ha falar que uma norma coletiva,v.g., que assegure direitos superiores a uma norma de âmbito federal, derrogue está, mas há falar que ela pode torná-la inoperante, pois a norma federal permanece em vigor norteando as vidas de outros trabalhadores não abrangidos por aquela categoria.


Com efeito, a norma mais favorável ao obreiro deve prevalecer, mesmo contra uma norma de maior hierarquia, salvo se houver "lei proibitiva do Estado". V.g, norma coletiva que fixa salários contra a política salarial do governo não deve prevalecer, pois existe outra heterônoma que impede a aplicação desta, de natureza autônoma. Finalizando, de notar que as normas devem ser comparadas em seu conjunto. E o que estabelece a teoria da incindibilidade ou conglobamento.


3.3. Regra da condição mais benéfica


A regra da condição mais benéfica pressupõe a existência de uma situação concreta, anteriormente reconhecida, e determina que ela deve ser respeitada, na medida em que seja mais favorável ao trabalhador que a nova condição criada por uma outra norma. A própria alínea 8ª do art. 19, da Constituição da OIT, consagra essa regra. No específico, em sendo substituído urn contrato coletivo (acordo ou convenção coletiva) por outro, as condicties mais benéficas daquele contrato devem subsistir, "tanto quando a condição mais benéfica haja sido concedida intuitu personae como quando resulte de uma norma geral, proveniente de uma lei, um regulamento ou um contrato coletivo". De La Lama Rivera. Ccondições benéficas somente aquelas que tiverem sido estabelecidas de forma definitiva, já que aquelas outorgadas tácita ou expressamente, em caráter provisório, não podem ser invocadas.


4. CONCLUSÃO


Arrematando as considerações retro expendidas, impõe asseverar que o princípio da proteção, ou protetivo, é principio nao so do Direito Individual do Trabalho, mas também do tack) de determinada norma, mister se aplicar a interpretação que mais beneficia o obreiro; da regra da norma mais favorável, que consiste em se aplicar a norma mais favorável mesmo de hierarquia inferior, se essa traz em seu bojo direitos mais amplos ao obreiro; e da condição mais benéfica, que consiste em garantir a condição mais favorável ou benéfica ao trabalhador, consagrada por uma norma pretérita, quando a outra traz condic 6es inferiores. Brasília, 27 de novembro de 1995

 

Transformando

Sonhos em Realidade

Na primeira parte da minha autobiografia, conto minha trajetória, desde a infância pobre por diversos lugares do Brasil, até a fundação do grupo Ser Educacional e sua entrada na Bolsa de Valores, o maior IPO da educação brasileira. Diversos sonhos que foram transformados em realidade.

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